terça-feira, 9 de setembro de 2008

Ícaro

Caí! Mais uma vez, Caí!
Tombei do sonhar alto
Por fugir à mesquinhês
Dos que vivem o fim do mês
Junto ao solo de asfalto.

E mais uma vez me levanto!
Uma; e outra; e outra ainda,
E tantas quantas eu cair,
E ainda mais uma vez!

E se o dia chegar
Em que eu ouse aprender,
Sem cair!,
O segredo fino de voar,
Ainda mais alto hei-de subir!

Leonel Auxiliar 1995/96

Ocaso

Aqui é o ocaso
E minh' alma cansada,
Confessa poemas
Perdidos nas rugas
Da roupa que tem por morada.

Pintou-se de brumas, de sangue,
de flores, de noivo, de luto
E de mil cores e dores

Entre as brasas que pisou,
Bebeu néctar e lodo,
Comeu natas e nadas e pão!
Pão que o diabo amassou!

Agora rima,
Perdida, caída,
Mas não vencida,
Por ter ousado, um dia,
Haver vestido a vida!

Leonel Auxiliar 1995/96

Rumores

Há rumores na cidade!
Dizem os que chegam do mar.
Uns, só por necessidade,
Outros porque querem voar.

Geometria improvável
Esta que me desenha o ser:
Entre a vontade de viver,
Passa a linha do sofrer.
E não cabe neste poema
A necessidade de morrer.

Vê tu, Nau que minh' alma levas,
Quão mais altas são estas marés,
Que se não fossem ao rés-vés,
Haviam de trazer as trevas,
Escuras e feias teias,
Que mais não têm que fazer
Do que fazer-me viver!

Leonel Auxiliar 2008

Navio

Numa parede esticada
No meio da janela
Quase quadriculada,
Vi chegar uma alma.

Respirar? Não sei se sabia!
Andar? Talvez não!
Mas o certo é que ia
Muito, muito apressada.

Voava quiçá, lágrima presa,
Nos olhos, o vazio cheio
Duma dor desconhecida.
E um peito que inchava!
Melhor dizendo: ofegava!

Era de certo uma vela
Que, avistada a foz do rio,
E não querendo ser navio,
Apenas ansiava
Beber todo o vazio!

Leonel Auxiliar 2008

Convés

Vês tu as torres além?
E aquelas sombras vermelhas,
Sangue de uvas velhas?
E sofres porém...

Até quando hás-de andar
Pelo convés desta vida,
Onde levas a passear
A tua alma caída?

Leonel Auxiliar 2008

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Esperando a Maré

Não me digas da tua espera!
Não me fales do vazio das horas;
Não me leves por qualquer rua
Onde aquela que tu adoras
Bela mulher de vestido, ou nua,
Ao sol, na praia, ao som da lua,
Por ser só quem queria ser,
Deixou de ser para ser só tua!

E se fores e não voltares,
Como o barco naufragado,
Mais fique do sonho dourado,
Do que os restos no fundo
Deste mar encrespado
Que cobre todo o mundo!


Leonel Auxiliar 2008